domingo, 26 de outubro de 2008

O NÃO CHEFE

Se eu fosse católico romano, eu respeitaria muito o chefe da minha igreja, o papa. O teria como autoridade espiritual sobre qualquer um que se declarasse católico romano. Mas só sobre os católicos romanos. Não consideraria que outros cristãos estivessem em “revolta” contra o poder legítimo. Por que? Preciso falar um pouco de história para que o leitor entenda minha posição.
Para que o papa fosse o chefe legítimo de todos os cristãos, seria necessário que o papado fosse reconhecido em algum momento da história como a instituição de chefia da igreja. Seria necessário que as palavras de Agostinho, “Roma locuta, causa finita”, fossem mais do que uma opinião entre outras. Seria necessário que houvesse real (ou pelo menos teórica) subordinação dos cristãos orientais ao Vaticano, antes do grande “cisma”. Teria havido uma história de documentos oficiais do bispo de Roma mostrando seu poder de mando no oriente.
Mas o contrário aconteceu. Houve flagrante falta de chefia do bispo de Roma sobre os cristãos orientais, ao longo de toda a história. Esta ausência de chefia do bispo romano é um fato tão bem perceptível na falta de documentação que o comprove e na fartura de documentação que prove a insubordinação dos orientais ao bispo de Roma, que é simplesmente uma verdade insofismável. Jamais houve um só metropolitano oriental que considerasse o papa como seu chefe. Na verdade, o suposto cargo de “chefe universal da Igreja” nem tinha nome, visto que a palavra papa, quando entrou em voga, era apenas uma designação para qualquer bispo metropolitano. A carência de qualquer comprovação de chefia universal do bispo romano é tão evidente que uma ou outra simples correspondência entre o bispo de Roma e alguma igreja aqui ou ali, nos primeiros séculos, são apresentados atualmente como prova cabal de seu cargo. Como se não houvessem muitas outras correspondências de apóstolos e bispos diversos a igrejas totalmente fora de sua área de atuação.
Havia uma autoridade que os cristãos orientais respeitavam desde o início. Eram os concílios universais. Inicialmente, sua autoridade se estabeleceu pela ação direta do Espírito do Santo de Israel. Agindo dentro de cada um (e o primeiro concílio foi muito mais aberto do que foram os dos séculos seguintes), convencia-os da verdade, levando a um consenso que era livre realmente, e não uma violência contra as consciências, como o atual conceito de consenso. Pelo hábito, continuou-se a considerar os concílios como autoridade, mesmo quando seu espírito passou a ser (no oposto exato do que ensina a Bíblia) “Não pelo Espírito do Eterno, mas por força e violência”. Nessa luta de foice no escuro, o bispo de Roma era um lutador a mais, nunca a autoridade que tivesse o poder de ordenar o que os outros deveriam pensar. Quando da oficialização da religião do império, o bispo de Roma, pela sua proximidade com o imperador, ganhou um aliado formidável. Mas nem mesmo assim sua palavra tinha mais força que o concílio. O imperador foi muitas vezes o verdadeiro poder moderador, e as decisões dos concílios, acertos que visavam manter algum equilíbrio entre as facções da cristandade para que houvesse unidade política.
Quando da questão “filioque” os cristãos orientais, que nunca foram sujeitos às bulas papais e aos concílios apenas parciais do ocidente, se viram cobrados de obedecer a quem nunca tinham obedecido, crer no que nunca tinham crido, vendo nos cristãos ocidentais um povo distante e estranho, que dizia coisas que lhes pareciam sem muito sentido, visto que séculos de desenvolvimento teológico, filosófico e social os separavam.

2 comentários:

Anônimo disse...

Questão “filioque”?

Aprendiz disse...

Daniel

Desculpe a demora. O texto abaixo eswclarece bastante bem a questão.

http://www.presbiteros.com.br/historiadaigreja/aquestaodofilioque.htm