Há alguns anos, estava na moda a histeria em torno do “bug do milênio”. Até o “momento final”, às 23:59 horas do dia 31 de dezembro de 1999, os jornais vendiam a “notícia” de que algo terrível poderia acontecer com a humanidade, pois seria perfeitamente possível que a maioria dos computadores enlouquecessem e passassem a funcionar de maneira totalmente imprevisível. Gente impressionável acompanhava temerosa as notícias. Quando nada de mais aconteceu, surgiram teorias da conspiração, como sempre envolvendo americanos e a CIA, tentando provar que não haveria bug nenhum, mas teria sido tudo uma armação.
É interessante a argumentação das pessoas para provar que um desastre se anunciava: “Se ninguém fizer nada para alterar o rumo dos acontecimentos, os grandes computadores vão deixar de funcionar na virada do milênio”. Na verdade, se ninguém fizer nada para alterar o rumo dos acontecimentos, todos os grandes computadores poderão parar em poucos dias a partir de hoje... Se ninguém fizer nada para alterar o rumo dos acontecimentos, todos os carros que se aproximam de alguma curva sofrerão um desastre, todas as pessoas que se aproximam de uma escada vão quebrar o pescoço, ou pelo menos se machucar um pouco, Realmente, se as grandes empresas, (principalmente do ramo financeiro), não fizessem nada para se adaptar à nova situação, os sistemas falhariam... Mas por que cargas d´água elas não fariam nada!
Como muitas das pessoas de classe média, nas grandes cidades, conheço algumas pessoas que trabalham com informática, dentro de grandes empresas. Apenas por ouvir comentários, sabia, muitos meses antes do “dia fatídico” que as grandes empresas nas quais meus conhecidos trabalhavam tinham escrito e testado exaustivamente os códigos necessários para a mudança de data. Nenhum de meus conhecidos que trabalham no ramo, mostrava qualquer ansiedade quanto ao assunto, ao contrário de outras questões (maior demanda de serviços durante o natal, por exemplo). Em suma, eu, um leigo no assunto, percebia claramente que não havia nenhuma emergência se aproximando, mas apenas um problema comum, que como quase todo problema tem solução comum.
Mas eu fico pensando... Se era tão simples para mim perceber que algumas grandes empresas estavam com a situação sob controle, por que motivo os jornalistas (e mais ainda, os editores) não percebiam não havia nenhuma grande instituição com sérias dificuldades para fazer a adaptação? É isso mesmo, por que não percebiam que não havia notícia nenhuma, que nenhum desastre iria acontecer? Bastava que alguns jornalistas sondassem alguns conhecidos dentro das grandes corporações. Mas eu estou esperando muito... Não é do interesse dos jornalistas perceber que não existe notícia. Não é assim que são feitos jornais.
4 comentários:
“Mas por que cargas d´água elas não fariam nada”
Porque esse sujeito aterrorizado não faz nada, não resolve seus problemas, não muda o curso dos acontecimentos: fica sentado reclamando por intervenção estatal, aguardando que o Estado cuide da situação e culpando ausência estatal por todos os problemas existentes e inexistentes também. Afinal, “alguém” tem de fazer alguma coisa; sim, mas nunca ele próprio. Assim, este senhorzinho satisfeito julga toda a humanidade por sua própria medida, e imaginando-se em situação similar – os computadores quebrando na virada da noite - já entra em pânico, constatando desesperadamente que o Estado ainda não pode interferir neste aspecto da gestão de empresas, não pode obrigá-las a contratar outras empresas para consertar as máquinas.
Na época, uma da manhã do primeiro dia de 2001, liguei meu computador IBM 486. O relógio havia voltado ao ponto de partida, uns 20 anos para trás. E o calendário terminava mesmo em 2000. Foi um erro de programação bobo, de quem não pensou muito adiante no futuro, mas ainda assim consertável. Meu computador mais novo, não lembro com qual versão do Windows, porém, nem sentiu a passagem, e alguma atualização automática cuidou de consertar o calendário. O evento todo parece o calendário Maya destes dias, que termina em 2012 e já desperta os mais excitadinhos pelo fim do mundo. Termina sim, mas como o do computador: para recomeçar do ponto de partida. Não é o fim do mundo, é o recomeço do mundo. Sorte que os Mayas já se foram e não precisamos nos preocupar com seus bancos e aviões, com o “bug do mundo Maya”.
João
Desculpe a demora em responder. Interessante essa visão das coisas, nunca havia pensado sobre isto, que uma pessoa projeta sobre os outros a sua inércia diante da vida. Vou pensar sobre o assunto, creio que você me deu idéias para um novo texto.
Katya
Grato. Já respondí no seu blog, naquela época, mas agradeço agora aqui no meu.
Pessoal, o blog da Katya é realemnte bom, confiram.
o que eu estava procurando, obrigado
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