domingo, 5 de julho de 2009

UM VÍCIO CHAMADO SOBERBA III

DENTRO DO PENTECOSTALISMO

Como os leitores já devem ter percebido, não discordo da atualidade dos dons do Espírito do Eterno. Mas, dito isto, temos de reconhecer que o pentecostalismo moderno, nas suas diversas vertentes, merece um capítulo à parte na história da soberba. É um tema um tanto difícil e espinhoso, ainda mais se desejamos evitar generalizações e má compreensão dos motivos das pessoas. Toda pessoa que conhece ou conheceu por dentro alguma vertente pentecostal, sabe do que estou falando. Existe um problema de soberba dentro do pentecostalismo, como existe dentro de qualquer movimento humano, mas existem particularidades a respeito da ocorrência da soberba entre os pentecostais, e é por isso que eu digo que esse assunto merece um capítulo à parte. Há alguns pontos que quer por em relevo sobre isto:
  1. Soberba no suposto uso do Dom de profecia.
    Não é difícil prever como o suposto dom de profecia pode ser um meio de opressão sobre os irmãos e obtenção de poder. Um pouco de leitura a frio, o conhecimento dos conceitos da congregação sobre a “doutrina” e sobre a pessoa que “recebe” a “profecia”, percepção das suas atitudes, modo de se vestir e se portar, reações à própria fala do “profeta”. Os motivos do “profeta” podem ser vontade de aparecer, desejo de poder, vingança, loucura. Alguns realmente confundem seus próprios pensamentos com uma suposta revelação. Sobre a dinâmica de como isto é recebido pelo povo, falarei depois. O ponto que quero ressaltar é que muitos pastores tem percepção de que algo errado está (ou pode estar) acontecendo, e se sentem desconfortáveis sobre isto, mas não sabem como lidar com o problema. Por que? As abordagens de muitos pastores a respeito do tema parecem-me ruins. Acredito, entre outras coisas, que tais pastores não tem instrumentos mentais com os quais possam tratar situação, e isto é, em grande parte, sinal dos tempos.
    Tenho visto duas abordagens principais. Há aqueles pastores que fazem uma abordagem binária: Os dons devem ser aceitos totalmente sem nenhuma contestação, pois isto seria impedir o “mover” do Espirito Santo. Quem pensa assim não tem parâmetros, as profetadas, supostos dons de línguas e “unções” as mais estapafúrdias tem livre curso, por mais estranhas, desrespeitosas e prejudiciais que sejam. Ou os dons devem ser proibidos e ponto.
    Outra abordagem é a analógica. Muitos pastores julgam que devem encontrar um suposto “equilíbrio” no tratamento da questão. Não parece que muitas pessoas tenham alguma idéia clara do que seja esse tal “equilíbrio”, de maneira que dificilmente podem encontra-lo. Mas a Bíblia fala a respeito de como lidar com o problema, visto que há vários textos no livro de Atos dos Apóstolos e principalmente nas cartas, que falam sobre os dons do Espírito. A 1ª Carta aos Coríntios é particularmente reveladora, pois trata especificamente dos vários problemas que podem estar associados à questão. E a abordagem que o apóstolo Paulo faz nessa carta não diz nada a respeito de “equilíbrio” (o que parece uma figura de linguagem que mais obscurece que clareia a questão) mas sim sobre compreender os fundamentos da questão, e com sabedoria aplicar essa compreensão aos casos objetivos. Figuras de linguagem podem se tornar muletas mentais, que substituem a compreensão real do problema por analogias, ao mesmo tempo que a mente anestesiada julga estar realmente pensando sobre o problema. A figura do equilíbrio, em particular, tirada de um conceito físico, induz aquele que a usa a adotar algum tipo de “meio termo”, o que pode ser uma solução boa ou não (geralmente não). Segundo a abordagem de Paulo, toda profecia, e portanto, toda língua interpretada, deve ser julgada espiritualmente (mas em muitos casos, só a confrontação com a Bíblia e com a lógica podem ser suficientes). Isso levará parte das profecias a serem aceitas e (grande) parte não, sendo que muitas ficarão “penduradas”, esperando o desenrolar dos acontecimentos. Não tem nada a ver com “equilíbrio”, é uma abordagem muito mais inteligente e prática.
  2. Soberba por não ser “tradicional”.
    É bastante visível essa soberba em ação nos comentários, nas “análises”, na cegueira em relação às qualidades e virtudes de crentes “tradicionais” e na cegueira em relação aos pecados e loucuras de muitos pentecostais. No meu caso em particular, cheguei a firmar a crença na atualidade dos dons do Espírito pelo estudo da Bíblia, pelo confronto de argumentos. Mas, muitas pessoas que tiveram alguma “experiência”, ao invés de buscarem a explicação do que aconteceu-lhes na Bíblia, perdem a confiança no estudo da Bíblia, e juntam-se a grande LEGIÃO (quem lê entenda) dos que denigrem qualquer estudo sério e sistemático das Sagradas Escrituras. Os que estudam são acusados de estarem presos à “letra fria da lei”, de serem promotores do “racionalismo árido”. Fazem coro com gente que odeia a Bíblia, como os “emergentes”, o pessoal da “teologia relacional”, “teologia da libertação”, toda esquerda “cristã”, a “teologia liberal”, etc. Eu me entristeço profundamente quando vejo pentecostais junto com esses tipos. Quem não leu o Salmo 119, não sabe o que está perdendo.
  3. Soberba por falar em línguas.
    Isto é particularmente estranho. Entre os pentecostais há muitos que consideram a glossolalia uma evidência de estar cheio do Espirito Santo. Não está escrito ou subentendido em texto algum da Bíblia. Mas quem tem um objetivo prévio de tirar certa conclusão, freqüentemente acaba, mesmo que inconscientemente, fazendo “exegese” tipo “conta de chegar”. Para quem não concorda com a tese e sente-se intimamente livre para ver o óbvio, esse orgulho apresenta-se como aquilo que realmente ele é. É possível ver claramente o desastre acontecendo bem diante dos nossos olhos.
  4. Estimulando a soberba dos “ungidos do Senhor”.
    Eu já falei sobre isso em outro texto aqui, o soberbo é intrinsicamente manobrável. Sendo um instrumento útil, seus mentores resguardarão seu “patrimônio”, incentivando sempre esse aspecto tão “interessante” da sua personalidade. Eu já falei sobre pastores que não sabem como tratar o problema, mas é óbvio que isso não encerra o assunto. Há muitos “pastores” que não teriam nenhum motivo para considerar a soberba dos “profetas” como um problema, se é que o leitor entende o que estou falando. Mas há mais do que crime doloso aqui. Dentro da própria congregação, a loucura de uns é apoio para a loucura de outros. E há um ponto particularmente espantoso sobre a psicologia de grupos: Não é a opinião da maioria que se impõe, mas a “opinião” de quem grita mais, de quem se impõe, de quem ameaça ou se faz de vítima (ou ambas as coisas ao mesmo tempo), de quem detrata, mente e abusa. É claro que a “superação” do “pensamento lógico desumano” ajuda bastante. Os piores casos são os de “pastores” promotores da maldade, em confluência com congregações particularmente desequilibradas. O resultado, como costuma acontecer numa dinâmica dessas, é o cerceamento das consciências, pois “ai de quem falar contra os ungidos do Senhor”. E a medida do pecado do povo continua aumentando.


Uma última palavra. Ninguém, por ser pentecostal, queira vestir uma carapuça que não lhe cabe. É um problema endêmico (mas não “universal” no meio pentecostal) , mas as piores coisas da descrição acima aplicam-se a casos extremos … como o de IVONE MUNIZ.